When Sci-Fi meets Trash-bashing, Scratch-building, & Graphic Designs!

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Beauty shot!

25 dezembro 2019

Capitão Futuro e as 7 Gemas Espaciais (Capítulo 17)


As últimas gemas
  
    Tranquilo, Capitão Futuro deixou um milhão em fichas no número 17. Sem se intimidar, Ul Quorn empurrou a mesma quantia para o número 28. O croupier ligou a roleta. A audiência em volta da mesa observava silente. Ninguém estava mais ansioso que Bubas Uum.
     Curt dirigiu o campo magnético e invisível do instrumento sob a jaqueta para que a partícula alfa fosse atraída para o seu número. Aumentou a força de seu campo. O raio cintilou ao colidir automaticamente com o grão de rádio, e brilhou mais uma vez para o número de Curt.
     -- Número 17 ganha de novo! bradou o croupier.
     -- Pague, Bubas mandou com a voz estrangulada na garganta.
     Trinta milhões em fichas foram para o número 17.
     -- Vamos continuar, disse friamente.
     -- Dez milhões no 28, e Quorn empurrou um monte de fichas.
     A assistência quase se engasgou. E mais uma vez as partículas foram desviadas pelo campo mais potente de Curt.
     -- Pelos deuses de Vênus, o terrano ganhou 900 milhões! exclamou alguém atrás dele.
     -- Tragam mais fichas e pague, ordenou Bubas Uum, a voz já ficando estridente.
     Os guardas vieram trazendo as fichas; como não havia muitas de um milhão, sacos com fichas menores foram colocados na frente do Capitão Futuro. Ul Quorn olhava feio para ele. Curt sabia que Quorn estava se arrenegando pelo seu campo mais fraco.
     -- Todas as fichas no número 17, declarou Curt.
     -- Novecentos milhões em um único número? gaguejou o croupier. Impossível!
     Curt virou-se com frieza para Bubas Uum:
     -- Você sempre se gabou de que nenhuma aposta é muito alta no Planeta dos Prazeres. Como vai ser?
     A fisionomia de Bubas Uum indicava que estava prestes a ter um ataque apoplético, mas ainda conseguiu responder:
     -- Eu... vou... aceitar a aposta. Não vai conseguir ganhar de novo. Posso cobrir a aposta com dinheiro vivo. Vou... vou ter que apostar o Planeta.
     -- Quero entrar nessa também, interrompeu Ul Quorn empurrando suas fichas à frente. Tenho mais de 600 milhões aqui. Vão todas para o número 28.
     -- Deuses de Júpiter, eu não posso cobrir essa a não ser com o Planeta! disse com a voz rouca. A probabilidade é de 15.000 para 1!
     Curt notou a mão de Quorn escorregando para dentro da jaqueta. Só podia estar regulando seu aparelho para a maior potência de campo a fim de sobrepujar o campo adversário.
     -- Será que ele consegue desta vez? Curt pensou em desespero. O meu já está no máximo.
     Não se podia fazer nada a não ser continuar. O dedo do croupier pressionou o botão da roleta. O rádio girava aumentando a tensão no salão. A disputa era a maior de todos os tempos e incluía o próprio mundo dos Prazeres. Contudo, somente Curt e Quorn tinham noção da verdadeira aposta! O raio de nêutrons brilhou. Outro átomo atingido e a partícula alfa liberada.
     -- Vejam! alguém gritou entusiasmado. Dezessete de novo!
     Verdade. O campo de Curt havia prevalecido atraindo a partícula mais uma vez.
     -- O terrano ganhou o Planeta dos Prazeres de Bubas Uum!
     -- Guardas! berrou Bubas Uum levantando-se.
     Os homens com uniformes dourados vieram correndo com as armas sacadas. Bubas apontou para Quorn.
     -- Prendam o terrano e este marciano! Tem algo estranho aqui. Eu vi o marciano mexer dentro do casaco!
     O Cap. Futuro, vendo a descoberta dos aparelhos iminente, pulou do banco e sacou sua própria pistola atômica. Mas era tarde. Os guardas atrás dele o imobilizaram e a Joan, N'rala e Ul Quorn.
     Bubas Uum rolou o corpanzil até eles e rasgou a jaqueta do mestiço revelando um instrumento pequeno e chato assentado por uma lente de cristal de quartzo.
     -- Eu sabia, vangloriou-se o joviano. Estava roubando.
     -- O terrano também, acusou Quorn olhando furioso para Curt. Procure no casaco dele!
     O casaco foi aberto e um instrumento similar exposto.
     -- Ambos trapacearam! esbravejou. Levem ambos e suas parceiras para a prisão. Vou mostrar o que acontece com quem tenta macular o trabalho digno das minhas mesas.
     Algemas de açolite prenderam os punhos dos 'réus' e todos saíram do salão da roleta. Através de uma escadaria estreita, desceram até as fundações abertas na rocha sob o palácio da Fortuna. Foram enfiados no que parecia uma das celas da prisão privativa de Bubas Uum, uma câmara com paredes de pedra sem janelas, com grades grossas de açolite. A iluminação vinha de uma única lâmpada de uranita.
     Os guardas ataram as algemas aos anéis na parede de pedra. Capitão Futuro olhou para Quorn e a marciana presos na parede oposta.
     -- Conseguiu bagunçar todas as nossas órbitas, não é mesmo Quorn? disse friamente. Não poderias ter sido um pouco mais astuto, não?
     -- Preferi denunciar você a deixar pegar tudo. Você não vai ter as gemas.
     -- Não tenha tanta certeza, Quorn, Curt riu sem vontade. Sua segurança não passou no teste no iate.
     -- Aquilo? disse condescendente. Aquilo foi um truque malicioso, Futuro. Talvez consigamos sair daqui com outro tão brilhante.
     -- Sei bem até onde confiar em você. Não pretendo fazer acordos contigo, Quorn. Virou-se para Joan. Anime-se, ainda não estamos acabados.
     -- Estariam, caso eu tivesse uma pistola aqui e pudesse usá-la, soltou N'rala.
     A porta se abriu e Bubas Uum entrou balouçante ladeado por dois de seus guardas que revistaram os prisioneiros.
     -- Usando truques tecnológicos para enganar rodadas honestas na roleta, não é?
     -- Pare seus foguetes bem aí, Bubas, escarneceu Curt Newton. Você utiliza um temporizador sincrônico dentro da coluna da roleta, e que escolhe os ganhadores aleatoriamente. Mas este não foi páreo para o campo emitido pelos nossos aparelhos. Foi só isso! Trapacear um velho escroque que nem você não é crime.
          Bubas Uum ficou de boca aberta com a revelação e um olhar de interesse iluminou a cara flácida.
     -- Como conseguiu, terrano? perguntou. Esse método que usou, se eu soubesse da existência dele antes já teria o controle absoluto sobre as apostas. Façamos um trato, sua liberdade pelo aparelho.
     -- Para você levar mais seres à falência? Curt ralhou.
     -- Ele não vai nunca fechar acordos com você, Bubas, interrompeu Quorn. Este aí é o Capitão Futuro!
     Bubas Uum puxou suas mãos rápido de Curt como se tivesse levado um choque.
     -- Capitão Futuro? apavorou-se. O que faz aqui? quis saber nervoso. As leis do Sistema não se aplicam ao meu mundo. Não há nada aqui para você fazer. Posso mandar executá-lo e nada acontecerá comigo.
     Curt olhou o joviano com desprezo.
     -- Seu sapo gordo! Estou muito feliz de ter vindo até aqui. Já está na hora de alguém faxinar esse lugar.
     -- Futuro está tentando embromar você, Bubas, explicou Quorn. Ele não veio aqui para investigar, ele só quer as duas gemas espaciais que estão em sua posse.
     -- Como sabe disso? Bubas perguntou com suspeita.
     -- Eu mesmo as quero, admitiu Quorn. Por isso estava tentando ganhar tudo de você incluindo as gemas, sabia que não as venderia por nenhuma quantia. Vou fazer um trato contigo, Bubas. Dê-me as gemas e eu adultero todos os jogos do cassino de jeito que jamais perca a não ser que queira. Certamente já ouviu falar do Dr. Quorn, o cientista.
     Bubas Uum ficou pensativo uns instantes.
     -- Eu odiaria me separar das gemas. São raras e valiosas. Você sabe que eu poderia tirar todas as informações que preciso através da tortura, não é, Quorn?
     -- Tortura? Em um marciano? riu-se Quorn. Jamais na história do Sistema alguém conseguiu tal feito, você sabe bem disso.
     -- Está certo, Bubas concordou com relutância. Fique com as gemas Quorn. Mas primeiro me prove que os aparelhos vão me dar controle total sobre as mesas de jogos.
     -- Vou desenhar os planos de construção, prometeu Quorn. Passe as gemas para mim. Posso ficar trancado aqui até que esteja satisfeito com o funcionamento deles. Acha justo?
    -- Justo? Sim, Bubas disse cauteloso. Trancado aqui não vai me trazer problemas.
     -- Claro, declarou Quorn com uma ponta de zombaria no canto dos olhos. Só quero que deixe N'rala voltar para a nave e que me dê um traje espacial para usar mais tarde.
     -- Não se engane, Bubas, cortou Futuro. Quorn está planejando alguma coisa com estas gemas que vai deixar a todos nós em perigo.
     -- O que é que eu vou fazer só com umas meras joias? Quorn quis saber com desdém. Ignore Futuro, Bubas. Você sabe que ele é o inimigo.
     -- Sei sim, murmurou Bubas. Vou ver como descarto ele e os amigos dele sem que eu seja implicado. Desenhe tudo, Quorn, enquanto vou pegar as gemas. 
     Os guardas tiraram as algemas de Quorn e N'rala e saíram com o chefe.
     -- Vá e aguarde no iate com os outros, N'rala, Quorn ordenou. Bubas vai ficar louco quando souber que fugi desta cela.
     -- Como "sair" com os guardas lá fora? indignou-se N'rala.
     -- Não vou sair dela, Quorn sorriu. Na verdade, vou para outro Universo.
     Os guardas deixaram a marciana sair como ordenado por Bubas. Quorn ignorou o outro casal e trabalhou nos planos do aparelho. Capitão Futuro observava sem ter o que fazer. Como poderia atrapalhar os planos de Quorn?
     Ouviu-se uma barulheira e Bubas Uum entrou arfando excitado. Atrás, vieram quatro de seus guardas, todos com hematomas e desgrenhados, arrastando o androide Otho.
     -- Desculpe, chefe, disse Otho ao ver Joan e Curt agrilhoados. Fui até o cofre de Bubas atrás das gemas e me prenderam.
     -- Amarrem este aí também, Bubas ordenou furioso. Este demônio dos infernos conseguiu nocautear três dos meus melhores homens.
     -- Melhor você mandar os homens caçar os outros Homens do Futuro e a nave deles, avisou Quorn entregando os planos. Tome os desenhos. Monte os instrumentos de acordo com estas especificações e prenda-os discretamente às mesas de jogo. Eles farão o serviço. Você vai conseguir escolher os ganhadores sempre que quiser. Agora, onde estão as gemas e o traje espacial?
    Bubas Uum checou os desenhos com suspeita mas depois entregou-lhe o pedido. Uma das gemas era vermelha e a outra de um negrume profundo.
     Futuro se retesou ao ver a gema negra pois conseguiu discernir um pequeno entalhe em sua superfície, e parecia um pequeno grão de areia vermelha. Curt sabia que aquela era a gema mais importante da coleção de Thuro Thuun. Era o pivô de todo o programa ameaçador que Quorn estava prestes a deflagrar.
     Bubas Uum saiu com os planos e deixou os guardas à postos. Quorn sorriu da sorte dos que ficaram trancados.
     -- Você está prestes a ver a minha vitória, Futuro. Será a última jogada.
     -- Não será derrota até que a última carta esteja na mesa, retrucou Curt com uma frieza que vinha da alma em desespero.
     -- A última carta já foi usada, e você sabe bem, Quorn soltou uma gargalhada. Observe enquanto eu libero o mais antigo dos segredos das pedras e viajo para onde Thuro Thuun foi 200.000 anos atrás para adquirir o domínio sobre os mundos.
     Capitão Futuro viu Quorn arrumar as primeiras gemas em fila e separar a gema negra. Azul, verde, branca, amarela, violeta e vermelha. Quorn pegou um diminuto projetor de raios-X e apontou para as pedras. Ouviu atento enquanto as gemas entregavam a última parte da fórmula. Quorn tremia ao receber a mensagem anciã. Quando finalmente se endireitou, exclamou:
     -- Agora sim posso seguir os passos de Thuro Thuun até o infinito.
      Ágil, o mestiço se enfiou no traje espacial e atou ao cinto um aparelho de metal azulado em forma de disco com finos cabos formando um copo. Olhou para Curt e sorriu.
     -- O mecanismo já está pronto há semanas, Futuro, de acordo com as instruções das primeiras gemas. Só estava esperando a parte do segredo contida nestas duas últimas gemas para operá-lo sem perigo.
     -- Sei, Curt retorquiu. Você não vai conseguir nada com esse plano maluco.
     -- Se Thuro Thuun conseguiu milênios atrás, eu também vou conseguir.
     O mestiço estava transmutado pelo excesso de confiança. Colocou o capacete de glassite e trancou-se no traje.
     -- O que ele está fazendo? Joan quis saber do Capitão.
     Quorn tocou um dos botões do aparelho azulado no cinto. Uma aura dourada envolveu sua figura que vibrava com a potência do campo radiante. E então, algo incrível aconteceu.
     -- Demônios do espaço, ele está encolhendo! espantou-se Otho.
     A figura de Ul Quorn encolhia mesmo. Estava 10% menor.
     -- Impossível! gaguejou Joan.
     --Não é, não. Ele usa a técnica descoberta por Thuro Thuun que permite qualquer um reduzir seu tamanho, esclareceu Curt.
     Ul Quorn continuava a diminuir. Com 5 centímetros de altura, correu em direção à gema negra no chão. Observaram a diminuta figura no traje espacial escalar a gema e correr até o grão de areia encravado nela e desaparecer de vez.
     -- Sumiu! Otho exclamou.
     -- Entrou no universo subatômico dentro do grão de areia, disse Curt.
     -- Então, Otho olhou para ele, quer dizer que as especulações dos cientistas da antiguidade são verdadeiras. Existe um Universo subatômico, ou melhor, vários, cada átomo é um... sistema solar... em... miniatura, gaguejou.
     Curt assentiu de cara amarrada.
     -- Sim, aquele grão de areia é uma galáxia. Thuro Thuun descobriu o segredo da miniaturização e viajou até a galáxia subatômica milênios atrás... e agora Quorn segue seus passos. Foi buscar a ameaça que jaz naquele grão-universo.
     





(continua... capítulo 18: O Subuniverso)  






13 dezembro 2019

Capitão Futuro e as 7 Gemas Espaciais (Capítulo 16)




O Planeta dos Prazeres
  
     "A autoridade do Governo do Sistema Solar e suas leis se estendem a todo corpo celeste que gira em torno do Sol."

     Os legisladores de tal disposição no sistema quiseram assegurar a ordem em cada unidade de matéria no Sistema, seja um planeta, lua ou asteroide. Contudo, eles não contavam com a aguçada esperteza de um certo joviano chamado Bubas Uum que encontrou uma brecha na lei.
     Bubas Uum era um jogador inveterado famoso cujas atividades ilegais lhe renderam alguns anos na prisão de Cérbero, uma das luas de Plutão. Ele havia aberto na época um cassino no meio das florestas desse mundo. Detido após uma operação policial, decidiu não burlar mais as leis do sistema. Sonegar era mais lucrativo e menos estressante.
     Através de uma empresa fantasma, Bubas Uum adquiriu um título de propriedade de um asteroide no anel externo do cinturão onde instalou palácios de jogatina e jardins, tudo debaixo do nariz da polícia, que por sua vez, esperava ansiosa para prendê-lo de vez no dia da inauguração.
     Foi aí que Bubas Uum lançou a cartada final. Secretamente, ele havia equipado o asteroide com motores de propulsão, potentes o bastante para mover o rochedo espacial para onde bem entendesse, como uma espaçonave. Então, ao ligar os motores, a força do empuxo foi usada para frear o asteroide, e mantê-lo estacionado no espaço.
     Dessa forma, o Planeta dos Prazeres, como foi chamado, não girava mais em torno do Sol, mas permanecia parado no lugar. Assim, burlou a Constituição e livrou seu mundo da jurisdição do Sistema. A Polícia Planetária nada podia fazer a não ser responder à autoridade de seu único dono, o obeso e ardiloso Bubas Uum.
     Era o mundo sem lei do Sol. Jogos ilegais e drogas ilícitas eram comercializadas e distribuídas abertamente. As únicas restrições eram discretamente impostas pelos seguranças de uniforme dourado. De todos os nove mundos chegavam diariamente os abastados, os entediados e os desocupados que se entregavam sem moderação aos gozos fáceis.
     Era esse mundo que ficou à vista da cabine da Cometa. Curt Newton olhou pensativo para o asteroide que brilhava no céu estrelado.
     -- Leve-nos para o lado noturno, Otho, ordenou. A Cidade das Oportunidades, como Bubas chama seu resort, é lá.
     -- Eu ainda não entendo o que você e a Joan sozinhos vão conseguir contra o balofo do Bubas Uum e Quorn, reclamou Ezra.
     Durante a curta viagem, Curt havia mudado sua aparência mais uma vez. Com uma cabeleira negra e a pele bem pálida, vestia um traje de cetim da moda. Joan se caracterizara como uma filhinha-do-papai, rica e mimada.
     -- Bubas Uum está de posse das duas gemas espaciais. Temos que pegá-las antes de Quorn, explicou Curt. Seria impossível invadir os cofres de Uum, que os guarda com uma diabólica engenhosidade, como já testemunharam vários larápios ingênuos. O melhor meio de haver as gemas é tentar ganhá-las no jogo.
     -- É uma ótima oportunidade de você quebrar-lhe a banca! disse Ezra. Como é que todos os que vêm para este covil vão embora lisos, sem nem um centavo? Ele depena todos!
     -- Isso mesmo, admitiu Curt. Por mais viciado que estejam as mesas de jogos, pode ser que eu consiga ser mais esperto que elas.
     -- Agora entendi, Chefe, Otho riu. Você vai tentar superar Bubas jogando as mesmas cartas!
     -- Essa é a ideia, disse o Cap. Futuro. Vou usar fogo contra fogo. Eu só quero as gemas espaciais. Todo o resto que vier de lucro pode ir para os projetos de caridade interplanetários. Vão ter melhor uso do que no bolso daquele cretino.
     -- E nós aqui, Mestre? perguntou Grag. Não vamos contigo?
     -- Preste a atenção, Grag, mexeu Otho. Vai ser uma festa você aparecer lá tilintando esse metal todo e expondo o disfarce do chefe!
     -- Enquanto eu e Joan estivermos lá, disse Curt a Otho, quero que tente encontrar Quorn e seus lacaios metidos, e o que andam fazendo. Com certeza, Quorn vai estar maquinando para pegar as gemas. Isso não pode acontecer! E você, Simon, dá para checar uma teoria para mim? Lembra-se dos nossos experimentos com compressão atômica? Será que pode verificar o alcance do processo de compressão? Grag vai ficar e te ajudar.
     As antenas lenticulares se fixaram nele.
     -- Rapaz, você quer dizer que Thuro Thuun e a fórmula secreta tem a ver com esse processo? Mas que fantástico!
     -- Talvez, mas tenho medo que seja verdade, retorquiu Curt. Agora você sabe por que estou ansioso, Simon.
     -- Claro, são mundos inteiros que sofrerão...
     Um calafrio perpassou a espinha de todos os presentes.
     Entrando no lado escuro, Chefe, Otho falou enquanto pilotava. Chegaremos lá na Cidade das Oportunidades em meia hora.
     -- Aterrisse no espaço porto sem chamar a atenção, ordenou Curt.
     A Cometa voou baixo por sobre a superfície do lado escuro do Planeta dos Prazeres. Jardins brilhavam sob a luz das estrelas nos parques logo abaixo. Passaram por uma usina atômica gigantesca em cujo centro distinguiam-se os tubos de propulsão na área do equador e cuspindo fogo.
     -- Lá estão os exaustores que mantém o Planeta dos Prazeres em sua órbita estacionária no espaço, comentou Ezra. Para o inferno com esse Bubas Uum!
     -- Olhem a Cidade das Oportunidades, disse Joan com entusiasmo.
     Erguia-se no horizonte como uma massa de torres brilhando em azul, vermelho e dourado. Hotéis, teatros, casas de diversão, todas se espalhavam em volta do Palácio da Fortuna, título que Bubas Uum dava de forma grandiloquente ao seu principal cassino. A Cometa desceu em um parque vazio não muito longe dos holofotes do espaçoporto. 
     O Cap. Futuro verificou se o aparelho que havia posto em seu cinto estava funcionando e virou-se para Joan.
     -- Certo, lembre-se de seu papel.
     -- Sempre quis bancar a pobre menina rica. Vou aproveitar a chance.
     -- Você e Grag sabem o que fazer, disse a Otho ao abrir a escotilha. E, Simon, trabalhe na teoria.
     O Mago da Ciência e a agente pisaram na noite calma do Planeta dos Prazeres. O ar estava fragrante, odores de ervas e flores de plantas estranhas suavizavam o cheiro forte característico da atmosfera sintética.
     Andando pela relva rala, o casal contornou o espaçoporto lotado de naves e iates de luxo que transportaram a clientela em busca de farra.
     Entraram na cidade como se fossem recém-chegados. Uma avenida larga pavimentada com mosaicos de mármore uraniano, ladeada com altas e graciosas árvores piam de Vênus e que levava diretamente pela cidade até o dourado Palácio da Fortuna.
     Seres ricamente trajados e de todos os planetas, assim como veículos variados, passavam pelos dois. A música saía alegre pelas portas dos mais variados estabelecimentos de prazer, muitas risadas, conversas e gargalhadas altas. Sob a noite esplendorosa, de estrelas e rastos de meteoros, a Cidade das Oportunidades era magnífica.
     Contudo, Cap. Futuro sabia discernir a tensão nas fisionomias. Risadas forçadas. Tinha noção de quantas pessoas vieram ao planeta para férias merecidas e partiam falidas, totalmente 'limpas' de suas posses com os jogos de Bubas Uum.
     -- Alguém já deveria ter dado cabo desse lugar, murmurou, já que não responde mesmo às leis vigentes.
     Mesmo com essas ideias na cabeça, Curt Newton cuidava para que seu semblante expressasse todo o tédio que um terrano rico e sofisticado poderia demonstrar. Ele e Joan olhavam displicentemente à tudo em volta até alcançarem os portões do Palácio.
     -- Me sinto com sorte hoje, disse Curt, alto o suficiente para ser entendido. Vamos tentar a sorte na rádio-roleta.
     -- É... bem... di-fí-cil, até... para você, falou Joan arrastando as sílabas.
     -- Se eu perder alguns milhares, Curt soltou casual, eu ligo para o 'papai' pedindo mais e o velhote me manda.
     Subiram os degraus da grand escadaria do vestíbulo com teto abobadado do Palácio. Aqui e ali notaram os brutamontes em uniforme dourado que compunham a polícia privativa de Bubas Uum.
     -- Bem-vindos ao Palácio da Fortuna, cumprimentou um oficial uraniano esquisito. Procuram a rádio-roleta? Sigam em frente.
     Passaram por outros salões de jogos: o salão de caça-níqueis, onde jogadores sem tempo a perder tentavam alinhar os nove planetas no mostrador e ganhar o grande prêmio; e o salão do dado quântico, com mesas de jogos barulhentas.
     O salão da rádio-roleta era o maior pois o jogo pagava mais alto. Era um salão todo prateado com o teto também em cúpula, decorado com lâmpadas em formato de estrelas e com brilho suave. No centro, a mesa enorme se rodeava de uma pequena multidão. Curt abriu caminho até a mesa.
     -- Podemos nos juntar ao jogo? reclamou. Quero jogar, não assistir.
     -- Melhor entrar depois, terrano, avisou um venusiano ao seu lado. Tem um marciano ali que está ganhando milhões. Não dá para competir.
     -- Não estou com medo, Curt respondeu sem dar muita atenção.
     Conseguiram chegar na ponta da mesa e levaram um choque, do outro lado da mesa, sentados, estavam Ul Quorn e N'rala.
     
   
  O mestiço marciano de tez moreno-avermelhada jogava impassível. Em frente estavam empilhadas fichas de prata no valor de mil dólares, e uma outra pilha de fichas de cem mil, douradas.
     Bubas Uum, o notório proprietário, sentava-se à ponta da mesa observando Ul Quorn. Ele era repulsivamente obeso. Seu corpanzil de proporções paquidérmicas sobrava da poltrona e sua pele esverdeada transpirava luzidia. Os pequenos olhos mostravam alarme.
     -- Bubas Uum está preocupado, riu o venusiano, agora atrás de Curt. O marciano já levou milhões e continua jogando.
     Ul Quorn levantou a cabeça e viu Joan e Curt se acomodarem na mesa. Mas não pareceu distinguir os inimigos por trás dos disfarces.
     -- Um milhão no 28, disse Quorn tranquilo.
     O croupier saturniano olhou para Bubas Uum.
     -- Aceite, disse o Joviano com voz dura.
     Outros jogadores em volta da mesa fizeram apostas módicas e o croupier saturniano ligou a roleta. O equipamento do do jogo era formado por um vaso globular de quase um metro de diâmetro assentado no meio da mesa. O vaso continha 100 pequenos entalhes numerados. Do centro do vaso saía uma coluna em cuja ponta existia um grão de rádio puro.
     Curt conhecia bem o princípio da roleta. A coluna com o grão de rádio giraria suavemente durante dois minutos até que um raio de nêutrons vindo do teto atingisse o grão de modo a liberar um único átomo de rádio, produzindo assim, partículas alfa. O número vencedor era aquele que atraísse as partículas. Era praticamente impossível trapacear nesse jogo criado com parâmetros científicos estreitos.
     O raio brilhou de repente do grão de rádio no instante que atingiu um átomo, e brilhou de novo em um entalhe próximo a Quorn.
     -- Número 28 ganha! disse o croupier espantando-se.
     Murmúrios de surpresa saíram dos espectadores.
     -- Banca, pague trinta milhões em fichas ao ganhador, comandou Bubas com suor pingando no queixo.
     O funcionário empurrou as fichas de platina para Quorn, que não as deixou onde pararam.
     -- Todos os trinta e um milhões no mesmo número, disse.
     Dessa vez ouviu-se vários gritos da plateia.
     -- Trinta e um milhões em um único número! Caso o marciano ganhe duas vezes mais, ele vai ganhar o Planeta de Bubas!
     -- Isso, pensou Futuro, é o que Quorn está tentando fazer, quebrar a banca de Uum e levar as joias. Minha ideia exatamente, e usando os mesmos meios técnicos que faz ele ganhar todas. Curt ligou o pequeno instrumento sob seu casaco bem discretamente. Veremos à quantas anda a sorte de Quorn.


   
    Futuro colocou um maço de notas sobre a mesa.
     -- Quinze mil no número 17, disse alto.
     Ul Quorn nem se mexeu. O marciano estava certo de vencer mais uma rodada. O croupier ligou a coluna no mesmo instante que Curt ligou o seu instrumento. Era um mecanismo que emitia um forte campo energético na forma de um raio fino. O campo magnético desviava as partículas alfa em movimento. Curt queria usar o mesmo princípio que Quorn usava para ganhar. As partículas alfa luziram.
     -- Número 17! gritou a banca enquanto empurrava fichas no valor de um milhão e meio para o lado de Curt, e em seguida coletou os trinta e um milhões de Quorn. Ele e N'rala se entreolharam céticos.
     -- Eles não entenderam como o aparelho deles falhou, refletiu.
     Com os olhos cerrados, Quorn reconheceu os jogadores intrometidos.
     -- Olá! disse com frieza para Curt. Não havia percebido vocês antes.
     -- Bom vê-lo de novo, sorriu Curt. Ao que parece, estamos competindo pela banca.
     -- Façam suas apostas, o croupier anunciou.
     E começou mais uma rodada de apostas cujo prêmio era o destino de mundos inteiros!




(continua... capítulo 17: As últimas gemas espaciais)  







29 novembro 2019

Capitão Futuro e as 7 Gemas Espaciais (Capítulo 15)



O Eremita Espacial
  
     Curt viu o iate Rissman soltando chamas dos propulsores para alcançá-lo. A intenção de Quorn era clara: atropelá-lo com a proa da nave! Curt flutuava no espaço e esperou. Precisou de nervos de aço para ficar observando impassível enquanto a assassina se aproximava. Não acionou um botão sequer até que a Rissman chegou a poucas centenas de metros. Com um empuxo do propulsor ele conseguiu voar para o lado enquanto a nave passou raspando, o clarão dos foguetes doeu na retina. O iate fez uma curva muito fechada para evitar um meteoro e saiu girando até que se estabilizou e voltou a repetir a manobra contra Curt.
     -- Dessa vez, não, Quorn! disse com os dentes cerrados.
     Ao escapar do atropelamento, o empuxo do propulsor o levou com toda a potência em direção a um dos aglomerados de asteroides que viajavam veloz dentro do cinturão entre Marte e Júpiter, hora se amontoando, se batendo, hora se afastando.
     Em pouco tempo ele se juntava às rochas itinerantes, e tudo o que precisava fazer era confiar em seus reflexos para não ter sua carreira abalroada por uma delas.
     Soltou uma risada vendo a Rissman se desviar do caminho do enxame de meteoros e desistindo da perseguição. Ul Quorn não iria se aventurar e arriscar-se a seguir Curt para dentro do enxame. Viu o iate mudar o curso e desaparecer no cinturão.
     -- Indo certamente pegar as gemas de Bubas Uum antes que eu possa interferir, Curt palpitou. Agora, onde está o planetoide do Ermitão? Se puder contatar a Cometa de lá ainda dá tempo de atrapalhar a órbita de Quorn.
     Nenhum ser era capaz de conhecer nem metade da complexa área do cinturão. Entretanto, Futuro sim, e melhor que qualquer outro. Alguns de seus amigos moravam em alguns daqueles pequenos mundos. Um deles era o Ermitão Espacial. Curt se certificou de que o planetoide onde ele morava ficava nas imediações.
     Emergiu apreensivo de dentro da massa de rochedos ameaçadora e perscrutou à volta esperando localizar a olho nu o pequeno ponto verde que era a residência do Ermitão. Acionou o propulsor e em pouco tempo flutuava sobre a superfície.
     Era um mundinho coberto de florestas e jardins com uma atmosfera clara e fina, espelhos d'água, flora e fauna abundantes e alienígenas. O Capitão Futuro voou em direção a uma clareira aberta na floresta. Mesmo freando na queda, rolou várias vezes por sobre o gramado. Levantou-se arfando.
     -- Onde será que se meteu o velho? Ele odeia qualquer tipo de tecnologia, mas deve ter algum comunicador por aqui para uso em emergências.
     Curt começou a perambular pela floresta numa espiral aberta e acabou se deparando com uma picada bem batida que o levou a um laguinho. Aproveitou a oportunidade para se despir do disfarce agora inútil do Camaleão e continuou pela picada mata adentro.
     A luz do Sol bem pálida se filtrava pelas copas das árvores de troncos verdes grossos. Pequenos animaizinhos um tanto grotescos, revoavam. Eram como pequenos coelhos, peludinhos, que mordiscavam os ramos mais altos. Curt se entreteu observando as outras formas de vida indígena do mundo arborizado. Algumas entravam nos troncos e os consumiam por dentro, outras voavam em formação tão estreita que perfuravam qualquer coisa em seu caminho, como uma broca.
     -- Bem, cá estamos! exclamou contente. Entrou numa clareira fechada que continha uma cabana feita de troncos verdes e teto de palha donde sobressaía uma chaminé. No quintal da frente, ajardinado, havia alguns animais pastando despreocupados próximos à uma porteira de madeira.
     -- Olá! Ermitão? gritou alegre. Você tem visita!
     A porta da cabana se abriu com estrondo revelando a figura idosa de um terrano de barbas longas e cabeleira grisalha. Vestido com roupas de couro cru, ele brandiu um tacape ameaçador para Curt.
     -- Cai fora do meu asteroide! o velho bradou com raiva. Não vou tolerar curiosos virem aqui me perturbar e...
     Parou e observou com mais atenção o 'estranho'. Reconheceu a efígie alta e ruiva do Mago da Ciência e sua raiva esvaneceu.
     -- Capitão Futuro! se alegrou e largou o tacape. Mas aí é outra história! Você pode chegar a qualquer hora, mas tenho tido visitantes por aqui recentemente que estão me deixando louco.
     -- Tantos assim? indagou Curt.
     -- Olha, teve um explorador mercuriano há dois anos, e dois jovianos a procura de metais ano passado. Vou ter que voltar a morar em um desses planetas apinhados de gente se começar a aparecer hordas de intrusos por aqui.
     -- Mas... três visitantes em dois anos? É muita gente mesmo, gracejou Capitão Futuro.
     -- Uma multidão! exaltou-se. Se continuar assim, vou ter que achar outro asteroide.
     Os dois eram amigos há anos. O ermitão se opunha ao fanatismo tecnológico, achava que a paixão pelo progresso científico não era certa. Desiludido com a civilização super tecnológica na Terra, buscou por um rochedo espacial bem remoto para fixar residência. Certa feita, Curt havia escorraçado uma gangue que intentou criar uma base no asteroide. Por isso, Curt era o único tolerado. 
      -- Onde está sua nave? O ermitão perguntou com espanto.
     Quando Curt lhe contou a história, o velho esbravejou.
     -- Eu sempre te falei que suas andanças pelo espaço iam te trazer problemas! É isso que dá quando as pessoas se enfiam nessas naves e máquinas dos infernos e esquecem a vida simples natural.
     -- Tenho que contatar os Homens do Futuro para virem me pegar na Cometa. Você guarda um comunicador, por acaso? 
     -- Comunicador? o recluso soou ofendido. Jamais teria uma máquina dessas no meu mundo! Outro dia eu me vi usando uma alavanca de máquina para arar a terra. Joguei-a fora! Não vou permitir nenhuma máquina idiota entrar aqui.
     -- Certo, certo. Não precisa queimar seus foguetes por isso. Curt acalmou-o rápido. Acho que consigo fabricar um. Tenho alguns instrumentos no cinto. Foi sorte eu ter pego eles do corpo do meu 'sósia'.
     -- A ideia de construir um aparelho aqui não me agrada, mas como é uma emergência..., reclamou o ermitão.
     O velho recluso olhou com desagrado o Capitão Futuro começar a montar um transmissor a partir de materiais comuns. Era uma tarefa que somente o Mago da Ciência poderia executar. Pegou os instrumentos e ferramentas compactas que sempre trazia no cinto e juntou o material que precisava. O instrumento de solda portátil derreteu certos minerais para transformá-los em glassite e em seguida moldá-los em 2 tubos grandes. Os acessórios de metal de seu traje espacial viraram conexões e fiação. Futuro não se estressou em criar uma tela para o transmissor pois a comunicação de áudio seria mais que suficiente. 
     Curt trabalhara tranquilo sendo assistido pelos animaizinhos de estimação curiosos do ermitão à sua volta. O idoso continuou a repreendê-lo com severidade.
     -- Toda essa parafernália de voar e se aventurar no vazio com essa palhaçada tecnológica. Como alguém pode ser feliz assim? As pessoas eram mais felizes no passado da Terra, quando não existia tecnologia e viviam uma vida normal e natural.
     -- De acordo com seu ponto de vista, Curt sorriu, as pessoas viviam mais felizes mesmo sendo bárbaras ignorantes, sem nem mesmo o fogo.
     -- Você está torcendo minhas palavras, reclamou. Você é que nem os outros, não sabe argumentar em uma discussão.
     Capitão Futuro terminou a tarefa, criou um transmissor tosco mas eficiente que rodava com uma bateria química de sais.
     -- Tem que funcionar, pensou. Até onde eu calculei, está sintonizado na frequência da Cometa que eu sempre uso. Bem, vamos ver. Capitão Futuro para a Cometa! Estou no asteroide do Ermitão Espacial. Venham logo.
     Repetiu a mensagem alto para o microfone em intervalos de cinco minutos. Desligou o aparato depois de uma hora.
     -- Só me resta aguardar agora. Devem ter recebido.
     -- Não vai funcionar, você vai ver, profetizou o Ermitão. As máquinas sempre nos deixam nas mãos quando mais precisamos delas. Mas enquanto você espera, que tal fazermos um lanche?
     
     As sombras se alongaram por sobre a pequena clareira à medida que o dia do pequeno mundo findava. O Ermitão trouxe algumas frutas e umas plantas estranhas cozidas. Ele e o ermitão comeram em uma mesa no alpendre da cabana. Curt olhou para o céu cravejado de estrelas e constantemente atravessado pelo flash dos meteoritos. Lá dentro, no meio da escuridão das estrelas estava o ponto amarelo do Planeta dos Prazeres.
     -- Quorn já deve estar chegando lá, e preparando a última jogada. Curt preocupou-se. Por que os Homens do Futuro não dão notícia?
     -- Não ofereço carne pois os animais aqui são muito pacíficos, não suportaria matá-los para comer, disse o ermitão. Olhe aquele ali. É um mímico. Já viu um? 
     Os mímicos dos asteroides eram animais assim chamados pois eram encontrados somente nos maiores corpos rochosos do cinturão. Tinham corpos globulares brancos e pernas amorfas com dois olhos esbugalhados. Sua habilidade principal era mudar a forma e aparência do corpo à vontade. Eram metamorfos, imitavam qualquer forma relativa a seu tamanho.
     Um deles estava bisbilhotando o transmissor e de repente, deu um giro em si mesmo, e lá estavam dois transmissores no chão! Mas logo voltou à forma animal.
     -- Está vendo? Inteligente ele, não é? riu-se o velho. Eles estão sempre a me enganar, se transformando em um utensílio. Um incômodo, isso sim!
     Curt recusou o convite do Ermitão de dormir na cabana, e ficou sob as estrelas do asteroide. Acordou com a fraca luz da aurora em seus olhos que perscrutaram sem sucesso os céus em busca da nave.
     Tentou apanhar seu cinto no chão e descobriu um cinto extra igual ao seu, que se transformou no mímico em sua mão.
     -- Seus amigos ainda não apareceram, né? disse o ermitão parado na porta e penteando a barba. Eu sabia. As máquinas sempre nos deixando na mão, eu te disse... Agora você pode largar isso tudo e viver aqui comigo, uma vida natural sem essa baboseira de ciência!
     -- Eu não! exclamou Curt. Lá vem a Cometa!
     Os ouvidos detectaram o ruído de serra elétrica que só podia vir de um motor em todo o Sistema. Da direita, veio a nave e aterrissou levantando poeira na clareira.
     Otho, Grag, o Cérebro, Joan e Gurney correram para fora. 
     -- Chefe, nem acreditamos quando recebemos a chamada! disse Otho, com os olhos brilhando de contentamento.
     -- Pensamos que estivesse morto, Mestre, bradou Grag. Encontramos seu corpo no espaço e até fizemos um funeral. O que houve?
     Curt lhes forneceu um relato breve dos acontecimentos anteriores. Ezra Gurney estapeou os joelhos deliciado com a história.
     -- Você realmente conseguiu enganar aquele lobo do Quorn, bem feito! ladrou o veterano. O truque do doublé ainda funciona bem, não é?
     A expressão no rosto da Joan mostrava uma alegria plácida.
     -- Estamos felizes de ter escapado ileso, filho, disse Simon austero, mas cujas palavras tinham peso.
     Otho entregou o anel-emblema para Curt.
     -- Tirei do seu corpo, Chefe, como uma lembrança.
     -- Ainda bem, agradeceu Curt. Odiaria ter perdido meu anel. Quorn teria notado algo estranho se não estivesse no dedo do doublé. Eu ia procurar ele mais tarde no espaço. Gravei na memória o local exato, a velocidade e direção que o corpo tomou. Mas agora, vamos direto ao Planeta dos Prazeres. Acho que o último round da busca pelas gemas espaciais e pelo segredo de Thuro Thuun vai ser travado lá.
     -- Por todos os santos do Sol, o que é isso? soltou Otho.
     Ele olhava para o mímico do asteroide. Tentava se transformar em um coelho alado que voava por cima deles. Voltou logo à sua forma original após ser bem-sucedido. O Cap. Futuro apresentou a espécie nova que Otho desconhecia.
     -- Mas ele é o melhor artista de disfarces do Sistema inteiro, exceto eu mesmo, claro! revelou Otho invejoso. Acho que ele seria um belo rival para o ursinho de Grag, não é? Ihk não vai ter nenhuma chance contra uma criatura inteligente dessas.
     -- Você está bêbado! gritou Grag. Garanto que o Ihk vai usar essa coisinha presunçosa para lavar o chão da Cometa!
     -- Posso levá-la para mim? Otho perguntou ao ermitão.
     -- Claro, leve-a! O bichinho só me atrapalha!
     Otho pegou o mímico. O animal olhou-o amistosamente e, sem aviso, alterou sua forma para imitar o equalizador de gravidade grudado no torso de Otho. Voltou à sua forma em seguida.
     -- Então vendo? Ele gosta de mim! alegrou-se. Vou te chamar de Ug.
     -- Você só está levando o bicho porque acredita que ele vai ganhar do Ihk! acusou Grag. Duvido! Você vai ver... Ihk vai comer ele vivo!
     -- Cumpro seu turno durante um ano inteiro se Ug não nocautear aquele boboca do Ihk em cinco minutos, desafiou Otho.
     -- Eu é que vou te render por um ano se o Ihk não levar mais que dois minutos para acabar com ele, rugiu Grag.
     -- Está apostado, disse Otho. Vamos ver quem ganha, então.
     O androide e o robô raivoso se apressaram para entrar na Cometa. Os outros rumaram para a nave também, e Joan perguntou preocupada:
     -- Os dois animais não vão se machucar?
     -- Eu os separo antes, assegurou Curt. Veremos quem esfrega o chão primeiro, Ug ou Ihk.
     
     Entraram na Cometa. Ihk, o ursinho pequeno e cinza, que mascava uma peça de cobre, veio trotando feliz em direção ao Grag quando este lhe chamou pelo nome. O bichano lunar se retesou e ficou olhando para os olhos grandes de Ug ao ser posto no chão por Otho. Os dois ficaram se olhando em cerimônia solene.
     -- Vamos, Ug, acabe com ele! instigou Otho. Rasga ele todo! Ele é um covardão.
     Grag bradava a mesma mensagem ao seu bichano e repetia telepaticamente ao mesmo tempo:
     -- Pegue ele e esfregue o chão da nave com essa bola gorducha, Ihk! Sem pena!
     Todos assistiam a cena: Ihk e Ug se aproximaram cara-a-cara e se cheiraram. Daí, para surpresa geral e consternação de seus donos, os animaizinhos começaram a pular, rolar e correr pela nave.
     -- Mas que raios! Ficaram amigos! gemeu Otho ressentido. Vamos Ug, pega esse urso idiota!
     Nenhum grito de guerra foi suficiente para fazer os dois bichinhos se pegarem em luta. Se comportavam como dois irmãos separados há anos. No final, em um rompante de alegria e excitação, Ug usou suas habilidades e se metamorfoseou em uma cópia de Ihk. Ezra gargalhou com vontade.
     -- Você agora tem dois ursinhos, Grag!
     -- Qual deles é o Ihk? preocupou-se Grag.
     Ug resolveu o enigma ao retornar à sua forma globular. Se aproximou de Otho e se esfregou em sua perna.
     -- Você me desapontou, Ug, grunhiu Otho. Como foi se amasiar com esse aí?
     -- Certo, então, Futuro interrompeu o show. Temos que ir agora. Até mais, Ermitão! gritou para o velho da escotilha da Cometa antes de fechá-la. Da próxima vez, vou te trazer uma unidade geradora.
     -- Você sabe muito bem que eu não quero nenhuma das suas engenhocas malditas! gritou o eremita idoso.
     Alçando voo, todos observaram o recluso pegar um cajado e esmigalhar o transmissor construído por Curt.
     -- Um mundo sem tecnologia, riu-se Gurney.
    Grag assumiu os controles. Os foguetes rugiam à toda potência enquanto a Cometa tomava o rumo do Planeta dos Prazeres pela zona apinhada de asteroides.



(continua... capítulo 16: O Planeta dos Prazeres)  




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